FAZEM-SE REVISÕES - corrigido


Será difícil para mim fazer o que vou fazer agora, mas não vou me eximir. Considerando que já bastam basta (1) de tantos erros, e que se livros, monografias e textos importantes continuar a serem continuarem a ser (2) tratados sem o devido cuidado, vai vão (3) continuar ocorrendo, para os donos dos escritos, situações vexaminosas como as que tenho observado.
  
Com tudo Contudo (4), veja o leitor que já fazem faz (5) mais de cinco anos nos quais que (6) ofereço meus préstimos de revisão textual, e, até hoje, não houveram houve (7) motivos suficientes para que algumas pessoas, que estavam realmente precisando deste desse (8) tipo de serviço, não me contratarem contratassem (9).

Pode de fato não ter nada haver nada a ver (10) uma coisa com a outra, mas um amigo meu garante que isto isso (11) se (12) sucede por que porque (13) todos tem têm (14) um primo que, supostamente, entende de português, e revisa de graça. E senão se não (15) é um primo é um amigo, um vizinho, uma tia... Tratam-se Trata-se (16) das chamadas revisões caseiras!

Agora o quê que (17) eu quero é ver o tal primo revisar esse este (18) texto e encontrar todos os 23 erros de concordância, regência, semântica, sintaxe e ortografia! E se por ventura porventura (19) o primo se (20) acovardar, da próxima vez não lhe o (21) chame, tão pouco tampouco (22) ao vizinho, chame ao o (23) Cruz!


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Importante: Todos os que leram este texto, sem exceção, "corrigiram" a frase "Será difícil pra mim fazer o que vou fazer agora". Tiraram o "mim" e puseram o "eu". Trata-se, aí, de um caso bem específico, e acho que ESTE ARTIGO que escrevi vai esclarecer por que se deve usar o pronome "mim" e não o "eu" nessa situação.

1) o verbo bastar não concorda com o sujeito “erros”, simplesmente porque “erros” é objeto e não sujeito da oração. Essa oração não tem sujeito.

2) nas locuções verbais o verbo que sofre a flexão é sempre o auxiliar, que sempre está à esquerda do principal.

3) a oração que está entre vírgulas (“para os donos dos escritos”) é um aposto explicativo, que pode ser dispensado para fins de análise. Tirando-o para analisar a oração principal, a enxergamos claramente: “vão continuar ocorrendo situações vexaminosas”. Ocorre que ela está na ordem inversa, o que dificulta ainda mais. Colocando-a na ordem direta, temos, enfim, isto: “situações vexaminosas vão continuar ocorrendo”; o verbo “ir” fica no plural “vão”, concordando com o sujeito “situações”.

4) “Contudo” é uma conjunção de contraposição, correta para o uso onde está. “Com tudo” é uma locução, similar a com pouco, com nada...

5) “Faz mais de 3 anos” e não “fazem”. Oração sem sujeito. “3 anos” não é o sujeito da oração. Fazer no sentido de tempo ou fenômeno da natureza sempre ficará imóvel na 3ª do singular. "Fez dias chuvosos"

6) Aqui, o pronome relativo “que” é o mais adequado.

7) O verbo haver no sentido de existir, em qualquer tempo verbal, é invariável, fica sempre na terceira pessoa do singular. “Motivos” aqui não é sujeito, mas objeto direto. A oração em questão não tem sujeito.

8) vide (18)

9) O verbo “contratar” acompanha o tempo verbal da oração, que está no pretérito. Simplificando o período, vemos claramente: “houve motivos suficientes para que não me contratassem”.

10) “nada a ver” é uma expressão clássica, que não tem nada a ver com o verbo haver.

11) vide (18)

12) Algo sucede, e não “se sucede”. Suceder não pede pronome, como suicidar, por exemplo, que é verbo pronominal, e que só se conjuga com pronome. (vide 20)

13) "Porque" aqui é conjunção, palavra única = pois. Esta minha postagem pode ajudar a compreender: Os 4 porquês

14) Ele tem; eles têm. Na terceira pessoa do plural do presente do indicativo, o verbo ter leva acento para se diferenciar da terceira do singular.

15) Aqui é “se não” = quando não, função de conjunção condicional.

16) Não há sujeito na oração em questão, por isso “trata-se” e não “tratam-se”. Aliás, essa expressão é invariável, sempre. 

17) O pronome “quê” acentuado, portanto tônico, só é usado em final de períodos, antes de algum tipo de pontuação; nas outras situações usa-se “que”.

18) Este, neste, deste, isto e similares são adequados para se referir a coisas ou seres em posse direta ou próximas de quem fala/relata: “revisar este texto é difícil”, “este país anda péssimo”, “neste momento estou digitando”. Já esse, nesse, desse, isso e similares se usa para referências a coisas ou seres que estão distantes, situações vagas e subjetivas: “esse computador que você tem à sua frente”; “esse tipo de serviço é péssimo”; “um amigo garante que isso não pode”, “desse modo não há quem resista”.

19) Porventura é palavra única, advérbio = por acaso. Por ventura é uma locução de uso raro, talvez numa frase assim: "por ventura achei dinheiro no chão!" = por sorte

20) O verbo acovardar é pronominal, pede pronome (inverso do caso 12).

21) vide (23)

22) Tampouco é advérbio = também não.

23) Caso de regência. Verbo chamar. Quem chama, “chama alguém”, não “a” alguém. Por não exigir preposição para a introdução do complemento, é chamado verbo transitivo direto, e o seu complemento objeto direto, representado pelo pronome “o”, no caso. “Chame o Cruz” = “Chame-o" ou, na fala familiar: "chame ele”. Errado é: "lhe chame”, “chame ao Cruz” ou "chame a ele".


Para finalizar: Todos, sem exceção, "corrigiram" o título, e o reescreveram assim: "Faz-se revisões". O correto é como está lá. É o caso clássico da passiva sintética; jogando para a voz passiva vemos claramente: 

Fazem-se revisões = Revisões são feitas 
Alugam-se casas = Casas são alugadas

Revisões é o sujeito, e o verbo deve sempre concordar com o sujeito. O problema é que quando o sujeito está posposto ao verbo, situação de certa forma incomum, dá a impressão para o leigo que a oração não tem sujeito, o que faria o verbo ficar invariável. Por isso é que, para saber revisar um texto, há de se conhecer sintaxe, a parte mais difícil do português. Quem quiser se aprofundar nisso, leia este artigo do profº dr. Cláudio Moreno, meu ídolo: Concordância com a passiva sintética


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cancruz@terra.com.br



Cesar Cruz
Jun 2014


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